quinta-feira, maio 31, 2007

"Quem lê tanta notícia?"

Informar é algo perigoso.

Sempre convém desconfiar do que nos é informado e conferir a validade dos ensinamentos. Nossos meios de comunicação – principalmente as TVs – assumem uma ambiciosa tarefa em nossa realidade: “educar” milhões de espectadores que tomam o que é dito e visto como a mais pura e inquestionável verdade. E é aí que mora o perigo.

Recentemente, o presidente venezuelano Hugo Chávez decidiu não renovar a concessão pública à RCTV (uma espécie de Rede Globo da Venezuela), despertando o clamor da mídia corporativista – quem diria – por “liberdade de imprensa” e “respeito à opinião pública” na América Latina.

Contudo, a campanha que vem sendo promovida evocando tais palavras de ordem é, no mínimo, patética. Não precisa ser nenhum entusiasta do presidente bolivariano para perceber que os fatos vão sendo deformados e o que precisa ser discutido se esconde. Na luta pela hegemonia, fala-se em “fechamento do canal” e em “liberdade de expressão”, mas pouco é dito acerca do papel dos meios de comunicação, tampouco é analisado o histórico da emissora que foi o pivô da tentativa de golpe de estado frustrado em Caracas, em Abril de 2002.

Como disse Muniz Sodré, “o ato governamental foi respaldado pelo preceito constitucional que outorga ao Estado a administração do espectro radioelétrico”. O Estado ainda é detentor de concessões de serviços públicos, como as de radiodifusão e de transportes, por exemplo – que podem ser interrompidos de maneira unilateral, caso não atenda mais aos interesses do Estado. Mas talvez não seja assim por muito tempo.

O documentário A Revolução Não Será Televisionada nos ajuda a entender o que houve com a emissora que encerrou seus trabalhos no último domingo de Maio deste ano após a medida de Chávez. E nos faz imaginar o bem que uma medida como essa não faria por aqui, não é mesmo?

Thiago Mattos.

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terça-feira, maio 22, 2007

CPI em todo mundo!

Sidarta Gautama (que na história budista largou sua vida de príncipe para atingir o nirvana) - quem diria - teria seu nome associado à construtora que, segundo os relatórios da Polícia Federal (PF), pagou uma propina de R$ 100 mil ao então ministro de Minas e Energia, Silas Rondeau. A explicação é que o dono da Gautama (construtora) se diz budista. Sabe-se lá que budismo é esse.

Todo esse estardalhaço para nada, pois qualquer brasileiro sabe que no Brasil funciona assim: “aos amigos tudo, aos inimigos a lei”, isto é, a Igualdade escrita em nossa Carta Magna nunca foi igual. Quanto melhor um cidadão se coloca na esfera pública – seja exercendo um mandato ou ocupando um cargo – mais privilégios ele tem a sua disposição e, logo, é mais difícil de puni-lo.

Fico maravilhado em como a PF trabalha bem e traz resultados. A cada mês, um novo escândalo político. Ora, ou corrompemos de modo muito sedutor (e por isso tanta coisa podre aparecendo), ou tudo está sendo transformado em espetáculo, passível de venda e consumo.

Não ponho minha mão no fogo por ninguém. Estudo os problemas deste país e nossa história de corrupção. Sei como é difícil pôr na cabeça de quem ocupa um posto público que aquilo não é seu – esse ranço patrimonialista grudou. Posto isto, não pretendo eximir ninguém de culpa. A probabilidade de que tudo ainda seja muito pior do que mostram os jornais é grande.

Fatos como o desespero dos parlamentares frente a qualquer sugestão de criação de uma CPI dentro do Congresso (apenas defendida pelo PSOL e PPS) e investigando os indícios de aliciamento de parlamentares em troca de emendas, diz muito. No fim das contas, os partidos se protegem. É vergonhoso.

Por outro lado, não consigo deixar de pensar que há algo de podre em nosso reino quando um assunto é alardeado sem ser discutido do jeito que é. Por exemplo, por que a grande imprensa não explora o tema do financiamento de campanha, ou da relação entre os mandatos de Brasília e as emendas vendidas? Por que não é divulgado quem banca cada ocupante de uma cadeira no Congresso? Quem representa os interesses de quem?

No final, com tanta informação truncada e acusação atrás de acusação, parece que nossa grande mídia corporativa (aquela que precisa vender) apenas nos entretém. Caso contrário, poderia ter seu calcanhar de Aquiles exposto. Afinal, quem lhe disse que sua ficha é limpa?

Já sei. Vamos mandar a PF investigar!

Thiago Mattos.

Imagem:
http://www.ribimbocadaparafuseta.blogspot.com/

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sábado, maio 19, 2007

¡Viva la Revolución!

Nem a notícia de que o príncipe levado não vai mais à guerra, nem a demissão de Paul Wolfowitz do Banco Mundial (bom exemplo para alguns de nossos políticos que cismam em promover os seus), nem outra descoberta de mais esquemas de corrupção envolvendo nomes de parlamentares subornados a liberar verbas para obras irregulares, muito menos a proposta desesperada do governo sugerindo dar dinheiro como prêmio aos alunos de escola pública que passem de ano.

Nada tem me chamado mais atenção do que o fenômeno dos blogs impulsionados pela revolução silenciosa que se forja na Internet, mudando hábitos e determinando toda uma nova cultura moderna e dinâmica.

A qualidade de muitos desses blogs - seja em qual língua for - desafia e compete com as mais conceituadas agências de notícias, já que, por estarem fora dos grandes veículos de comunicação, providenciam um diferencial inigualável no olhar sobre as coisas. A Internet tem permitido que essa diversidade de olhares se expresse e interaja com uma força nunca vista antes - a tão falada web 2.0.

As grandes corporações detentoras da verdade – por aqui apelidadas de imprensalão - estão de cabelo em pé, pois o monopólio sobre os fatos escorrega de suas mãos de maneira rápida e irreversível. Nada pode ser mais atraente do que um mesmo mundo com seus diversos olhares e contribuições.

Eu mesmo, quando quero ler sobre uma notícia na Internet, raramente vou correndo aos jornais – e nunca somente a eles. Fanzineiro antes mesmo de me tornar um blogueiro, leio os blogs hoje como quem lia os fanzines tempos atrás. O cheiro artesanal não é o mesmo mas a essência punk do-it-yourself se mantém. Só que agora em maior escala.

Descobrir que um montão de gente por aí pensa como você, perceber opiniões diferentes das suas ou simplesmente ter acesso ao conteúdo produzido e criticado por pessoas que tem tanto a dizer mas nunca teriam chance numa mídia vertical, tudo isso é fascinante.

A dedicação impagável de pessoas comprometidas apenas em democratizar a informação, suas contribuições dentro dessa revolução silenciosa feita por cada um de nós em tempo real, as vozes que potencializam e cada interferência ativa nossa no processo, enfim, o papel dos blogueiros está mudando o mundo.

E duvido que nos exigirão diplomas pra isso.

Thiago Mattos.

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quinta-feira, maio 10, 2007

Precisamos de um milagre!

O espetáculo criado em torno da visita do Papa Bento XVI ao Brasil só perde para o espetáculo criado em torno do tão aguardado Pan – apelido carinhoso da 15ª. edição dos Jogos Pan-americanos, que acontecerá desta vez no Rio de Janeiro.

Joseph Ratzinger chegou ao Brasil num dia bem conveniente aos parlamentares de Brasília: a mesma quarta-feira em que foi aprovado o aumento dos salários dos nossos congressistas em 29,81%, passando para R$ 16.512,09 - o que representará um gasto extra superior a R$ 600 milhões por ano. Os novos salários serão:

Presidente da República

R$ 11.400

Vice-Presidente da República

R$ 10.700

Ministros

R$ 10.700

Parlamentares

R$ 16.512


Para se ter uma idéia, além do seu salário, um deputado atualmente recebe outros benefícios como:

13º. salário

R$ 12.847

Verba indenizatória

R$ 15.000

Auxílio-moradia

R$ 3.000

Verba de gabinete

R$ 50.851

Telefones e correios

R$ 4.268

Ajuda de custo (2 vezes ao ano)

R$ 12.847

Passagens aéreas

Depende do Estado


A visita estratágica do Papa que, entre outras coisas, tenta recuperar a cambaleante influência da Igreja Católica na América Latina, veio em boa hora. Com o catolicismo falido e desertado - nem os shows do Padre Marcelo conseguiram segurar por muito tempo os fiéis - toda manobra política dentro da Igreja é possível. Não se espantem se em pouco tempo João Paulo II for canonizado também. Opus Dei... Opus Dei...

Em boa hora vem a questão se o Brasil é realmente um Estado laico e até onde vai a interferência insistente e chata da Igreja Católica em assuntos vitais como a legalização do aborto e a polêmica que envolve as pesquisas com células tronco, por exemplo. Como disse nosso atual ministro da Saúde, José Gomes Temporão, o aborto não é uma questão filosófica mas sim uma questão de saúde pública - milhões de mulheres morrem por ano devido a esse problema que não é discutido abertamente.

Mas quem se importa? Temos o Papa e logo teremos o Pan! Mais que isso: teremos um santo brasileiro e (oba!) talvez mais um feriado! Com tantos absurdos por aqui, parece que precisamos mesmo de um milagre.

Thiago Mattos.

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segunda-feira, maio 07, 2007

E daqui a cinco anos?

O povo francês escolheu seu novo presidente. Com 53% dos votos, o conservador Nicolas Sarkozy derrotou a socialista Ségolène Royal, que chegou aos 47%. Diferentemente do que acontece no Brasil, o voto na França não é obrigatório. Mesmo assim, o país registrou o maior índice de participação nas urnas em 20 anos – cerca de 85% dos franceses votaram.

As notícias publicadas sobre a vitória de Sarko – como o chamam seus entusiastas – vão de especulações de cenários mais caóticos sobre o incerto futuro francês às possibilidades mais férteis de uma mudança para melhor no país. Em muitos casos, as informações parecem chegar poluídas, dependendo de quem as escreve.

Acompanhei os debates, a votação e a cobertura internacional da eleição. Logo após o fechamento das urnas, saiu o resultado parcial dos votos – que é super-rápido na França. Ségolène Royal prontamente reconheceu sua derrota, dizendo que “o sufrágio universal se expressou” – os socialistas estão longe do Palais de l’Elysées desde 1995, último ano de François Mitterrand no poder.

Minutos depois, Sarkozy faria seu discurso de vitória tentando ser conciliador e causando surpresa entre os que o ouviam. Mostrando respeito pelas as idéias de sua rival socialista, disse que seria o presidente de todos os franceses. Também mandou um recado aos “amigos americanos”, lembrando da amizade entre os dois países: “amizade é aceitar que seus amigos podem pensar diferente” – frase que deixa dúvidas quanto a tão propagada admiração de Sarkozy pela política de George W. Bush.

Sarkozy ainda lançou um apelo ecológico ao seu amigo que fala inglês: “uma grande nação como os EUA tem a responsabilidade de não fazer obstáculo na luta contra o aquecimento global mas, ao contrário, assumir essa luta pois o que está em risco é o destino da humanidade”.

Claro que sabemos que uma coisa são as palavras do discurso, outra será a prática. Teme-se que as promessas do conservador custarão muitos direitos sociais do povo francês. Sarkozy venceu dizendo que vai trazer a França de volta ao trabalho.

Dentre os pontos do seu programa de governo, destacam-se a flexibilização da carga máxima de 35 horas semanais de trabalho, a diminuição de impostos sobre as horas extras e a criação de um Ministério da Imigração que enfrentará com uma postura mais rígida os imigrantes ilegais no país.

Filho de um imigrante húngaro, Sarkozy chamou de racaille (algo como ‘gentalha’) os jovens filhos de imigrantes das periferias envolvidos nos protestos, causando ainda mais revolta entre eles. Na mesma noite em que saiu o resultado das eleições francesas, 367 carros foram queimados e 270 pessoas foram presas após enfrentamento com policiais. Os violentos protestos tomaram conta da Place de la Bastille em Paris e de outras cidades como Lyon, Toulouse e Marseille. A truculência policial não é exclusividade brasileira.

Com quase metade do eleitorado insatisfeito, os desafios de Sarkozy à frente da sexta maior economia industrial serão muitos. Unir a França é apenas um deles. O desemprego no país chega a 10% e já em Junho terá de enfrentar as eleições legislativas. Além disso, precisará de muito manejo político para lidar com a situação do refém francês nas mãos do Talibã e as conseqüências do veto a Turquia na União Européia.

Fica agora a curiosidade de saber como será a França nos próximos cinco anos.

Thiago Mattos.

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terça-feira, maio 01, 2007

"O que eu quero é sossego"

"O trabalho enobrece o homem
para o qual trabalhamos"

(Moduan Matus)
Um trabalho pode ser de faculdade, físico, intelectual, lucrativo, enfadonho, temporário, escravo, digno, dispendioso e de muitos outros tipos, mas é quase sempre trabalhoso. Muitas são as definições para as atividades realizadas ao longo dos séculos pelos homens, suas motivações e transformações no tempo.

Podemos trabalhar rebecendo de forma assalariada, ou apenas pela experiência, como fazem estagiários, que muitas vezes ainda têm que pagar por isso. Podemos ralar todos os dias no calor, como os vendedores de sorvete na praia que vendem o almoço para comprar a janta; ou ganhar a vida como a maioria dos parlamentares brasileiros, que desperdiçam o dinheiro público e só trabalham três dias na semana, quando o fazem.

Poucos gostam de trabalhar, é fato. Na maioria das vezes, as pessoas o fazem apenas por questão de conveniência, precisam ganhar dinheiro para sobreviver ou manter seus pequenos luxos. Além disso, a maioria das pessoas não gosta do trabalho que tem. São exploradas e produzem algo fora de seu contexto para o ganho de uma outra pessoa e sua irrisória remuneração não paga a chatice daquela tarefa.

Penso nas moças que vendem cartões de celular pré-pago no metrô repetindo mil vezes o nome das operadoras e nos camelôs da Uruguaiana ao mesmo tempo em que penso nos empresários e doutores do nosso país. Tirem-lhes os salários e considerem apenas suas atividades, quantos deles se diriam felizes e satisfeitos no que fazem?

Ok, digamos que os camelôs não precisassem fugir ou apanhar da polícia e que os empresários ou políticos pudessem ser presos se pisassem na bola. Nessas condições, numa gama de milhares de profissões do Brasil, quantos ainda estariam satisfeitos com a sua?

É preciso
encarar e compreender nosso passado escravista para percebermos que pouco difere do nosso presente. Assim ficaria mais fácil refletirmos sobre o que é preciso para não haver mais escravos modernos num futuro próximo. E quem sabe, enfim, a palavra trabalho possa ter um significado mais agradável.

Thiago Mattos.

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