quarta-feira, maio 17, 2006

Quem são nossos presos?

São Paulo, o maior centro financeiro do país, finalmente se recupera depois de quatro dias refém do Primeiro Comando da Capital (PCC), uma facção criminosa que comandou uma onda de rebeliões dentro de 78 prisões. Os criminosos também promoviam do lado de fora das cadeias ataques a policiais por todo o estado, assim como o incêndio de ônibus, fóruns, agências bancárias e a morte de quase 70 pessoas.

Nesta segunda-feira (15/05), houve o maior congestionamento do ano na cidade e talvez tenha até registrado um recorde histórico: 195 Km às 17h30, deixando mais de 5 milhões de pessoas sem transporte, já que as empresas de ônibus não liberaram um terço da frota, temendo mais ônibus queimados. A onda de pânico que tomou conta da cidade pode até ter sido maximizado pela ampla cobertura jornalística da TV, como declarou o governo do Estado, mas de certo nos trouxe mais uma vez para o centro da discussão de um dos maiores problemas sociais que o Brasil enfrenta: a falta de uma eficaz política de segurança pública para lidar com a violência urbana.

A péssima condição do sistema carcerário brasileiro aliado à falta de uma integração entre as polícias federal, civil e militar, mais uma vez nos lembra que devemos tratar com seriedade este problema que faz vítimas impiedosamente. A ausência de organização federal contra o crime organizado e a fácil corrupção dos policiais, mal treinados e mal pagos, só pioram o problema.

Diferentemente do que ocorre no Rio de Janeiro, os criminosos de São Paulo estão muito mais organizados e centralizados. Os ataques coordenados, facilitados pelo uso de telefones celulares dentro das prisões, chamam a atenção pela maneira como operam. Detentos de outros estados também se rebelaram, obedecendo ordens vindas de São Paulo.

O dinheiro sujo gerado pelo tráfico de drogas e armas está criando redes que torna difícil diferenciar qual parcela vem de onde. Há também quadrilhas que se organizam pelo contrabando, pelo controle do recolhimento do lixo público ou dos transportes. Pouco a pouco, tudo se mistura. Logo, o dinheiro ilegal usado num financiamento de campanha eleitoral pode também ser o dinheiro manipulado pelos mesmos criminosos.

Pesquisadores e estudiosos apontam para a continuação dos ataques, seja dentro dos presídios ou nas ruas. O sociólogo francês Loïc Wacquant, professor de Berkeley e especialista no assunto, chama a atenção para o fato de que nas últimas décadas as elites políticas brasileiras têm usado o estado penal – a polícia, os tribunais e o sistema judiciário – como o único instrumento não só de controle da criminalidade como de distribuição de renda e de fim da pobreza urbana. O sistema penitenciário funciona como um “campo de concentração” para os muito pobres, segundo ele.

Por tudo isso, as causas do crime devem ser atacadas na raiz, não mais apenas remediadas. O próprio Estado propaga o preconceito de classe e de raça através da maneira como trata o assunto. Precisamos providencialmente enxergar que a falha está na desigualdade social mantida institucionalmente no Brasil. Episódios como o massacre do Carandiru ou o assalto do ônibus 174 nos lembram que enquanto ignorarmos a raiz do problema, a morte de inocentes será tratada como um acontecimento banal.

Thiago Mattos.

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14 Comments:

Anonymous Anônimo said...

Eis-me aqui novamente!

Cara, realmente é infeliz o fato de, como quase sempre por aqui, as soluções serem pensadas somente a curto prazo. E quanto pior fica a situação mais difícil fica uma solução imediata.

Mas nesse caso acho que nem o remédio está sendo dado. Ninguém vai conseguir me convencer de que é difícil barrar a entrada de celulares sem a conivência de quem toma conta. E qual é o grande impedimento a se instalar bloqueadores mesmo? Penitenciárias superlotadas e mal vigiadas também incitam a formação de grupos organizados lá dentro que se estendem ao lado de fora. Além do que, não se pode esquecer que prisão é uma punição e deve ser tratada como tal. Não dá pra ficar fazendo concessões demais aos criminosos.

Só pra completar, 65 ônibus queimados, ataques a 9 agências bancárias, 35 policiais executados. Realmente alguém acha que houve exagero na cobertura da imprensa? Isso é guerra civil! Acho que a reação foi até pequena demais! E o governador ainda vem falar que a situação estava sob controle. Realmente seria cômico se não fosse (muito) trágico...

10:49 AM  
Anonymous Anônimo said...

O comentário do governador de SP, Cláudio Lembo, ao negar a oferta do governo federal que ofereceu tropas para SP, foi que a medida era desnecessária. Mas devemos lembrar que há pouco tempo Geraldo Alckmin deixou o governo de SP para concorrer às eleições presidenciais de outubro. Deste medo, a recusa do governo de SP, teve uma motivação política: não queiram queimar o filme do PSDB e evitar a crítica político da admissão da real situação.

11:40 AM  
Anonymous Anônimo said...

Vcs viram o q o delegado-geral da Polícia Civil - Marco Antonio Desgualdo - disse?
"Chegaram a dizer que os bandidos receberiam televisão de plasma. O plasma que eu conheço é o do sangue. A polícia foi pra cima"

E na capa do GLOBO dessa 4a. tá na manchete "Polícia reage co matança em SP"

Essa é a nossa polícia educada msm pra matar? Ela se confunde com os bandidos. Precisa dizer mais alguma coisa?

3:43 PM  
Anonymous Anônimo said...

Bem, se o cara q tava gravando os depoimentos da CPI do Tráfico de Armas não tivesse vendido por 200 reais a fita aos advogados do Marcola, chefe do PCC, onde continha a informação da transferência dos chefes da quadrilha pra outro presídio, talvez poderíamos apenas culpar apenas a polícia por ganhar mal.
Calma aí, o cara era funcionário da Câmara. 200 reais por uma fita???


E outra, fiquei besta com o governador de SP culpando a 'elite branca' pela violência, por essa nao esperava, êta comentário pertinente! Gostei de ver!

10:38 AM  
Anonymous Anônimo said...

Mas gente, o medo é de quem tem muito a perder, das madames, dos donos de restaurantes. Todo dia tem bala na favela e isso já virou rotina para mta gente. A maioria das pessoas que moram com o descaso do estado a miséria não tem qse nada a perder né?
Beijos.

11:01 AM  
Blogger Sangue de Barata said...

Por falar nisso, o SANGUE quer convidar todos vcs a participarem de um ciclo de debates organizado pela Secretaria de Direitos Humanos do Estado do RJ e pela OAB-RJ que trará entre os expositores o Tenete Coronel da PM Mário Sérgio de Brito Duarte, comandante do BOPE, pra falar sobre o 'caveirão', como é conhecido o carro blindado da PM que sobe os morros batando terror, litaralmente, na população, vale a pena o pessoal participar em peso:

Favelas e Diretos Humanos
dia 25/5/2006 - 5afeira às 9.30h da manhã no auditório da OAB-RJ (R. Marechal Câmara, 150, 4 andar)
Informações: 2224-9387

PS: Serão atribuidas 4h de estágio pela OAB

www.direitoshumanos.rj.gov.br

Vejo vo6 lá!

7:27 PM  
Blogger Wallace said...

A nossa sociedade copia REALITY SHOWS (novelas reais não seria uma expressão melhor?) mas não copia exemplos como as prisões dos EUA (privatizadas) ou atitudes como a da cidade de Nova York, como o "tolerância zero".
Enfim, sei que já virou lugar comum dizer direitos humanos para humanos direitos, mas um criminoso que comanda toda essa matança, exigindo entre outras coisas TV DE PLASMA PARA ASSISTIR OS JOGOS DA COPA (!) merece no mínimo ser colocado preso junto a facção criminosa ADVERSÁRIA...

4:45 AM  
Blogger Sangue de Barata said...

O mesmo sociológo citado texto deu uma entrevista na FOLHA, onde diz:

O "tolerância zero" no Brasil seria um erro duplo: primeiro pq a queda espetacular do crime em N. York não tem nada a ver com a política de "tolerância zero" do prefeito Giuliani, já estava em curso quando o prefeito apareceu em cena e acontecia também em outras cidades americanas e canadenses. Segundo porque no Brasil, aumentar os poderes da polícia é o equivalente a restabelecer a ditadura sobre os pobres e destruir ainda mais as bases democráticas.

11:50 AM  
Anonymous Anônimo said...

Vou te dizer que mandou bem o governador de SP ao dizer que a burguesia paulista tem um comportamento cínico da 'minoria branca brasileira', q explora os pobres e sustenta a miséria, q vai ter q abrir a bolsa. gostei de ver msm! Mas essa burguesia vende esse pensanmento pra mto gente fora dela também, não é?

12:42 PM  
Anonymous Anônimo said...

A cada dia, a cidade de SP 'ganha' 840 novos presos, o q fazer com tanta gente?

4:02 PM  
Anonymous Anônimo said...

Segundo dados da polícia paulsita, o PCC alçanca uma arrecadação de 700mil reais por mês; os membros do PCC se transformaram em presos 'sindicalizados'. Antes de Marcola, a contribuição era opcional, agora é obrigatória e é ela q garante aos presos a proteção e os benefícios. A lógica do PCC não é de ser dona dos ponos de venda de drogas - como o CV, no Rio, é mas como a cobrança de um aluguel, onde só sobrevive quem aceitar a autoridade déspota do PCC e pagar por isso.

11:49 AM  
Blogger Hugo Mendes Guimarães said...

So quem ja esteve preso ou teve familiar proximo nessas condicoes sabe do que se trata.
Se imagine voce dentro de 9m2 com mais 25 caras que voce nunca viu..suados,fedidos,colados,nervosos(muito mais que voce que chegara agora),revoltados...
imagine revesar na hora dormir,os mais velhos dormem,voce passa a noite em pé,somente nos dias seguintes tera direito de descansar de 2 a 3 horas por noite.
Ser alimentado por ração,comida de porco e nao ter direito a CAGAR na hora que tiver necessidade,somente no horario de banho de sol.

se eu tivesse num lugar desses,a unica coisa que eu desejaria ,certamente,seria fugir,tocar o zaralho,fogo,rebeliao..e com certeza em 1 mes la dentro estaria tao tomado pelo odio quanto os demais.

A prisao no Brasil,de fato, é um dos maiores problemas na minha opiniao.Prisao aqui,pra mim,HABILITA MONSTRO e nao REABILITA GENTE.

Outro dia conversava com meu pai sobre isso.reformado da marinha,conheceu bastante coisa,paises e diferentes formas de sociedade, ele me disse,nao recordo onde,de uma prisao que era numa ilha,nao no brasil, a km "alem mar",que nunca houve rebeliao,tentativa de fuga e ate mesmo morte entre os presos.
pensei , UTOPIA,mas ele me disse que nessa prisao a maior dor dos presos era a "distancia do mundo",certamente mesmo que na epoca existisse celular, sinal la nao chegaria nem por osmose..
os presos dividiam celas com mais 3,todos com duas devidas camas e um banheiro e uniformes ,tinham profissao,trabalhavam la dentro e isso diminuia sua pena,alem de ajudar financeiramente suas familias,tinham cursos,palestras,acompanhamento medico e psicologico... muitos de la sairam com profissao.
caras que tinham 30 anos de prisao,reduziram pra 12 com muito trabalho.
a ideia,conceitos e valores desses homens foram (re)feitos.
e eles tiveram oportunidade de serem uma outra coisa,a maior dor desses era a TOTAL exclusao da sociedade e do mundo.ao passo que tinham base para transformar isso.

"havera liberdade sem a previa permissao da loucura" ja dizia clarice lispector.
abracos

11:06 AM  
Anonymous Anônimo said...

Pois bem, tem mta gente q acha q bandido bom é bandido morto. Ou seja, q fazendo uma limpeza bonita nessa raça, tudo se resolve.
31 das 110 mortes q ocorreram dos dias seguintes às rebeliões em SP não tinham qualquer ligação com o PCC.
Está havendo um uso político dos fatos criminosos da semana passada e tá td certo, msm assim. Matar agora é tao normal q pouco importa se quem morre tem sobrenome ou usa antenas e tem sangue verde.

4:19 PM  
Anonymous Anônimo said...

Eu entendo a postura de quem anula o voto. De fato, a insatisfação com toda essa situação de corrupção que se deflagrou no governo Lula deixou muita gente desesperançosa. Aliás, mesmo que ñ tivessem ocorrido todas essas CPIs a própria postura do governo Lula; de ser uma continuidade dos 8 anos de FHC já vinha deixando muitas pessoas desiludidas. Lula veio com uma proposta de mudança, de uma certa ruptura com algumas medidas neoliberais do governo FHC, mas qdo chegou lá fez o contrário, e mergulhou o país em um cenário ainda mais engajado no neoliberalismo, do que o governo FHC havia feito.
Acho que essa campanha pelo voto nulo é um fruto de tudo isso, a desilusão pela corrupção, e a desilusão política mesmo com os rumos do governo e do próprio PT, que nos dias de hj ñ pode mais ser visto como um partido de esquerda, o mesmo vale para o PCdoB.

11:08 AM  

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